O mercado da aldrabice
EFAB⚽LAÇÃO (33)
Está a começar oficialmente a época maluca dos negreiros da bola, para alívio de editores sem acesso aos protagonistas do futebol e com dificuldade em matar o vício aos adeptos dependentes de novidades enquanto o esférico não recomeça a rolar.
“Querem informação? Comam chouriços!” - é o princípio que norteia, em 99 por cento dos casos, a concepção, produção e apresentação do “noticiário”, acompanhado de comentários e estatísticas promocionais, sobre os mercadores do futebol, os caixeiros-viajantes dos clubes e as últimas promoções dos catálogos Transfermarkt.
No Twitter circula uma compilação de 79 nomes de jogadores estrangeiros que nas últimas semanas foram associados ao Benfica por pelo menos um meio de comunicação - espécie de prenúncio de um verão cheio de lixo mediático e pasto à especulação. Um sinal de que as secções de enchimento de “chouriços”, um legítimo e tradicional ramo do jornalismo de vão de escada, laboram freneticamente.
A “febre dos reforços” do Benfica está tão quente que os experts até competem no campo dos desmentidos. “Já dissemos em primeira mão e dois dias antes da concorrência que o negócio de Kerkez já não se faz” - ufanava-se um “mercadista” numa das televisões líderes de audiências, que tenta dar à banha da cobra a imagem de um perfume de “grife”.
Dos primeiros tempos da actividade dos agentes do futebol, a que se dava o imponente nome de “empresários”, recordo os cuidados que tínhamos antes de libertar um nome e do pânico da descredibilização, do jornalista e do meio, no curto período entre a notícia, - geralmente creditada a fontes identificadas, tão reduzido era o número de agentes - e o anúncio confirmador. Hoje, um nome atirado ao ventilador das manchetes desportivas, nos jornais e nos espaços audiovisuais dedicados ao assunto com “especialistas”, encartados ou não, tem a mesma idoneidade daqueles repórteres criminais, bem vestidos e maquilhados, que coscuvilham a partir da cena do crime “temos a informação, que ainda não conseguimos confirmar, de que…”
Vivemos o estertor do jornalismo, numa dimensão analógica do caos informativo que a Inteligência Artificial nos reserva para um futuro próximo. Esta comercialização desregulada da aldrabice futebolística, numa selva de promiscuidade entre intermediários e comunicadores, com a bitola das comissões a rondar já os 12 por cento, exige há muito uma intervenção superior, uma chancela de credibilidade que separe o trigo do joio e que, como o ovo e a galinha, afinal sempre existiu e é, até, mais velha do que a própria notícia: a fonte identificada.
Presumo que os títulos de “Zequinha na lista”, “Zecão no radar” ou “Zecaço referenciado” criem aos editores atuais a percepção valiosa e bem remunerada de satisfazer os clientes-leitores, transformando estes tempos de jornalismo moribundo em desesperadas feiras de sonhos e esperanças, sem respeito pela realidade - mas são em primeira instância um serviço ilegítimo ao comércio e aos seus especuladores, punível pela Lei de Imprensa.
Como dizia Giordano Bruno, que morreu na fogueira da Inquisição por causa da obsessão pela verdade, “se non e vero, é ben trovato”.
IMAGEM Twitter (Lista de 79 novos jogadores associados ao Benfica)