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J Q M

Fui jornalista, estive em todo o tipo de competições desportivas ao longo de mais de 30 anos e realizei o sonho de participar nos Jogos Olímpicos. Agora, continuo a observar o Desporto e conto histórias.

J Q M

Fui jornalista, estive em todo o tipo de competições desportivas ao longo de mais de 30 anos e realizei o sonho de participar nos Jogos Olímpicos. Agora, continuo a observar o Desporto e conto histórias.

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O Benfica foi o primeiro e único clube do mundo a vender dois jogadores por mais de cem milhões de euros. Até hoje, houve apenas 13 transferências acima desse valor e duas saíram da Luz.

Félix e Fernandez, gémeos imperfeitos, separados na maternidade e agora reunidos na casa adoptiva de Stamford Bridge.

Após seis meses e duas dezenas de jogos, o João português e o Enzo argentino são protagonistas do mercado internacional, tão idênticos, mas tão distintos: um de concepção natural, o outro de barriga de aluguer, um que marca passo, o outro que arrasa, um que maravilha e o outro que envergonha.

Ambos decidiram sair para clubes da segunda linha europeia e figuram hoje, lado a lado, no Chelsea, podres de ricos aos vinte e poucos anos, mas sem qualquer garantia de um futuro desportivo à altura de um valor nominal ampliado pelas circunstâncias, como soldados da fortuna sacrificados ao desígnio superior do vil metal, do qual ninguém, ninguém mesmo, consegue escapar.

Por isso, é difícil entender que a venda de Félix, pelo rei Vieira, tenha sido endeusada como uma benção e a de Fernandez, pelo príncipe Costa, seja abominada como uma praga. Que se exalte ainda hoje o soberbo trabalho de convencer os basbaques do Atlético de Madrid, mas se amaldiçoe até à eternidade a soberba preguiçosa dos novos-ricos do Chelsea.

Que se babe deleitosamente sobre cada ocasional fogacho do português pela sua imagem de marca, mas que provoque náuseas a simples associação do nome do melhor médio do mundo ao glorioso alfobre do Seixal. 

Que a um se aplauda, por excesso, a natural evolução na carreira e a outro se acuse, por despeito, de falta de compromisso. 

Que se compreenda, ao fim de quatro anos sem qualquer triunfo, a perda de força competitiva como consequência da opção de venda dos melhores jogadores, mas se julgue plausível que esse sucesso seja marginal à perda, sem acautelar a substituição, de um campeão mundial. 

A venda inflacionada de Félix deixou os benfiquistas eufóricos: “bem os enganámos”. A saída precipitada de Fernandez deixou-os furiosos: “fomos enganados”.

Félix é um filho e terá sempre as portas abertas na Luz. Fernandez, um bastardo indigno de passar, sequer, pela Segunda Circular.

É realmente incompreensível que duas situações tão semelhantes possam despertar explicações tão diversas como o “factoring” claro dos espanhóis e o “factoring” obscuro dos ingleses, que a cláusula de rescisão signifique pagamento a pronto, como num divórcio, mas possa ser a prestações por conveniência do comprador, que se tenha feito tudo para vender um e se queira fazer crer que se fez tudo para não vender o outro ou que do nível fora de série se passe tranquilamente para o nível Chiquinho, sem ofensa.

São os olhos apaixonados dos adeptos que projectam estas “diferenças”, pois no essencial nada mudou com a rotina dos mil e quinhentos milhões de euros arrecadados em exportações de jogadores ao longo deste século.

O passivo financeiro não diminui, os dirigentes e a estratégia não mudaram, o agente intermediário mantém o exclusivo, as comissões injustificadas só aumentam e a dependência de treinadores circunstancialmente em estado de graça, de Lage a Schmidt, é a bendita estrutura que mantém a casa de pé.

O Benfica continua perante o mesmo infinito e incontornável motivo que nos últimos 30 anos levou quase todos os grandes ídolos, a começar por Rui Costa, a trocarem o compromisso do coração pela sensatez da razão - a irresolúvel “equação” entre vender e vencer.