É o Super Homem? É um avião? É a Águia Vitória? É o Di Maria?
A populaça fixou-se nos ecrãs com a mesma excitação dos pontas-de-lança colados à vedação do aeródromo, de nariz no ar e coração aos pulos, as redes mapearam à polegada o rasto digital do Netjets entre Ibiza e Tires e a CMTV a transmitir em direto a aterragem de um TVDE com asas, mas sem passageiro, um Transporte Vazio De Estrelas.
Deve ter sido o anticlimax do ano, com o Terceiro Anel a congestionar o Flightradar24 para seguir o CS-LTH com a mesma paixão, ou maior, do que a expectativa de ver aterrar em segurança sobre um naco de bife a mascote de rapina em enésimo voo picado sobre o relvado da Luz.
Afinal, Di Maria, por mais um dia, não chegou. Será que vai chegar hoje?
Cada dia é um dia Di Maria, como o aviso aos alienados do vinho na parede das tabernas antigas, “Hoje não se fia, amanhã sim”.
Mas neste vazio que angustia os benfiquistas como o nevoeiro do Levante nas praias do Reino, vislumbra-se cada vez mais nítida a sombra, como um fantasma, do anti-herói.
O novo Cavani, gritam os sebastianistas.
Outro Ricardo Horta, agouram os velhos do Restelo.
Do que é que estamos a falar? - perguntaria o comentador Rui Pedro Brás. Do estado do jornalismo, em particular o desportivo, que já foi uma escola por onde passaram quase todos os maiores da profissão em Portugal. Como se queixavam os meus avós para as suas Marias à hora da mesa, "esta trilha está didi*" - este jornalismo está dideza*.
Passou mais de um mês, não me lembro de ter sido citada uma única fonte nominal, do jogador, que ainda libertou uns "sorrisos esclarecedores" ao ser apertado por microfones num qualquer evento de férias, aos dirigentes, passando pelos agentes e intermediários. Apenas vizinhos, conhecidos, passantes que ouviram alguém falar.
E as redes, claro, o jornalismo de rabo sentado, as redes que ontem paralisaram o mundo encarnado com um devaneio de alguém que descobriu um voo privado entre Ibiza e Tires: “ecce homo!”.
Como o enredo de uma novela, capítulos fantasiosos de uma realidade paralela com fundos, laivos ou ténues contornos de verdade e muito “wishful thinking”, extraordinária expressão do inglês que sintetiza o essencial desta época do ano.
- Benfica seduz Di Maria
- Di Maria a um passo do Benfica
- Aí está o regresso de Di Maria
- Di Maria já está
- Di Maria sorri ao Benfica
- Di Maria sente o Benfica
- Di Maria: "Estamos perto”
- Di Maria como o aço
- Di Maria perde dinheiro na Luz
- Di Maria quase a chegar
- (Di Maria) Estou a Chegar
- Di Maria chega hoje
Do Verão de 2020 para hoje nada mudou. Na altura foi Cavani, outro cliente de Ibiza, o sebastião de ocasião:
- Benfica sonha com Cavani
- Esforço por Cavani
- Cavani aceita 3 anos
- Cavani avançou
- Cavani a caminho
- Cavani é para fechar hoje
- Benfica sem dinheiro para Cavani
E há ano, com Ricardo Horta a mesma receita a alimentar a pauta jornalística de um mês sem bola:
- Ricardo Horta é o sonho de Rui Costa
- Horta quer o Benfica
- Adeus Braga, olá Benfica
- Horta mais perto, negócio está fechado
- FC Porto tenta desviar Horta
- (Horta) a chegar
- Horta para o estágio
- Benfica já procura alternativa (a Horta)
José Neves de Sousa, um dos grandes mestres, tinha um comentário definitivo para as dúvidas, perto de se tornarem desilusões, geradas pelas maiores expectativas: “está tudo tratado, só falta o dinheiro”.
Entretanto, em cenas do próximo capítulo, mas com corpo de letra muito abaixo de parangona deixando escapar uma pontinha de “vamos lá a ver”, o clássico final feliz: “Di Maria esperado hoje para assinar contrato”.