Fogo nas padarias
Se todos os treinadores do campeonato fossem padeiros, haveria no final um padeiro-campeão.
Entre João Pereira, Bruno Lage e Vitor Bruno joga-se este ano a gloriosa corrida ao título do quanto mais cozido melhor, em que se tenta passar ao lado de todos os qualificativos profissionais, desde a falta de currículo à falta de carteira, nivelando por baixo em nome da convicção autoritária dos respectivos patrões, a contas com as linhas vermelhas de orçamentos limitados por uma sequência de erros de gestão.
Em tempo de carestia, os padeiros poupam na farinha, produzem pão sem sal e cozem demais a massa.
Assim fazem os treinadores de futebol mal amanhados quando sentem o quentinho do forno a chegar-lhes ao pêlo: poupam no risco, produzem futebol circular e agarram-se ao resultado, amedrontados pelos infelizes que na bancada agitam lenços brancos como se estivessem numa pizzaria de Nápoles a cantar o “Funiculì, funiculà”.
É neste ponto de cozedura branda que se encontra o Benfica de Bruno Lage, produzindo um futebol-carcaça, empastelado e desenxabido, sem o miolo macio nem o encanto estaladiço das maminhas do clássico papo-seco, capaz de justificar o preço ao balcão apenas pelo leve sabor a “factura” argentina numa fornada ou com o ocasional travo a “bazlama” turca na seguinte. Os ingredientes estão lá, mas a massa carece de fermento e não cresce.
É o que também dizem no Porto, que Vitor Bruno perdeu os papéis da receita da regueifa, o saboroso pãozinho dos domingos, como se a padaria estivesse órfã de identidade, trocando a algazarra festiva das romarias tradicionais por uma procissão burocrática e sensaborona.
De João Pereira, já se sabe, não passa de um aprendiz a pôr lenha no forno, abandonado à sorte de uma iminente explosão da caldeira.
Parece que está tudo mal, com as manifestações e desordens de clientes descontentes às portas das panificadoras da bola, exigindo as cabeças dos oficiais sempre que deixam queimar as côdeas. Parece injusto, considerando que um deles, por mais escarvunçado que fique, acabará por ganhar o prémio de campeão dos padeiros dentro de alguns meses, com a mesma justiça sem sentido com que alguma pastelaria de bairro ganha o prémio do melhor Bolo Rei da cidade.
Primeiro, segundo e terceiro, perdendo, empatando e vencendo, geram insatisfação entre as clientelas, porque jogam mal, não satisfazem, não deleitam, não têm “atitude”.
Primeiro, segundo e terceiro!
Parece irracional, mas já o poeta romano dizia que este é o jogo que agarra o povo à esperança: “panem et circenses”, pão e circo.
Foto Record