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J Q M

Fui jornalista, estive em todo o tipo de competições desportivas ao longo de mais de 30 anos e realizei o sonho de participar nos Jogos Olímpicos. Agora, continuo a observar o Desporto e conto histórias.

J Q M

Fui jornalista, estive em todo o tipo de competições desportivas ao longo de mais de 30 anos e realizei o sonho de participar nos Jogos Olímpicos. Agora, continuo a observar o Desporto e conto histórias.

Para aquecer este verão sem calor em que anda toda a gente feliz e contente com o futebol positivo, Pinto da Costa veio “acusar” publicamente o Benfica de só querer “guarda-redes aleijados”. Disse-o como se as lesões graves de jogadores espelhassem a inferioridade ou a incompetência de um clube.

Isto dias depois de ter contratado à pressa o argentino Marchesín para substituir de emergência o “aleijado” Diogo Costa.

Isto pouco depois de confirmar que o FC Porto “inscreveu” na Liga um guarda-redes a sofrer de uma gravíssima patologia cardíaca. 

Para lá de não se entender como pode uma Liga profissional (ou outra) aceitar a inscrição de um jogador incapacitado pela Medicina Desportiva, como infelizmente está Iker Casillas, são o teor, o tom e o objectivo da declaração do velho dirigente que deviam ser escrutinados, em particular pelos que batem palmas e se riem com tamanha alarvidade.

 

Hoje começa a Liga portuguesa e, não tivesse eu preocupações profissionais com o dia a dia do futebol, diria que não tinha dado por isso.

As redes da Liga Portugal divulgam um poster das camisolas à roda do patrocinador e perguntam qual é a preferida - estranha prioridade informativa. As primeiras páginas dos jornais, especializados e generalistas, ignoram totalmente ou apenas assinalam a agenda. O mercado e a vida de Bruno Fernandes estão por cima de tudo.

Quem se queixa de demasiado futebol na televisão, por exemplo, permanece indiferente e descansado pelo “low profile” deste assunto, a remeter apenas para o umbigo de cada clube.

Sim, o Benfica vai esgotar a Luz e pouco interessa o adversário.

Sim, os sportinguistas pensam na viagem à Madeira como se não houvesse amanhã.

Sim, o FC Porto está em transição europeia, com a cabeça nos incentivos orçamentais. Braga e Guimarães também.

Sim, “a arbitragem está muito melhor”, garantem antigos maldizentes dos órgãos federativos.

É o futebol de verão, amigável, europeu, da taça da liga (dizem-me que já começou) ou de campeonato, com jogos para a família, reencontros, confraternizações e “olas” na bancada.

A Liga começa esta noite com um palpitante Portimonense-Belenenses, sabia?

E pronto. Quatro horas da tarde no meridiano de Greenwich e a proposta que o Manchester United estava “a preparar” por Bruno Fernandes não chegou a Alvalade. Neste tempo em que os jornalistas dão as notícias e depois ficam à espera que se confirmem, esta era claramente exagerada, apesar de repetida exaustiva e diariamente ao longo de cinco semanas. Exagerada a notícia e exagerados os valores pretendidos.
Nem o milagreiro Jorge Mendes conseguiu vender Bruno Fernandes pelos números sonhados pelo Sporting, ao ser arregimentado tardiamente e quando os cavalinhos e girafas do seu carrossel já estavam montados e sem dinheiro para mais voltinhas. Nem pela moeda oficial da Gestifute, os famosos “mendilhões”, o negócio rodou.
O capitão do Sporting não está sozinho, não foi caso isolado. Neymar, Pogba, Bale, Coutinho, Milinkovic-Savic, Dybala e Eriksen, todos candidatos a transferências milionárias num valor global projectado próximo dos mil milhões de euros, continuam na sala de embarque à espera que alguém se condoa da chatice das suas vidas nos clubes onde não se sentem bem. Aguentem firme.
Se pensarmos nos 10 por cento dos Mendes e Raiolas desta engrenagem, podemos calcular que haja por aí muita gente com as férias estragadas, em esforço extra para gerar uma nova onda de loucura, antes de setembro, na Europa sem Inglaterra.
Bruno Fernandes e o Sporting voltam-se agora para este segundo mercado, de valores significativamente mais baixos. Só restarão meia dúzia de clubes capazes de pagar 50 milhões por um jogador (Real, Atlético, Barcelona, Paris SG e Juventus, Inter), mas nenhum deles tem o português no azimute. O bluff de Frederico Varandas não virou a mesa.
Milhares de portugueses interrogam-se sobre a falta de interesse do mercado internacional por Bruno Fernandes. Não entendem que os grandes compradores de jogadores adolescentes com poucas provas dadas por verbas exorbitantes optem pela sensatez quando se trata de atletas experientes e de alto rendimento regular. E este primeiro grande fracasso de Jorge Mendes ainda engrossa o pessimismo e o temor de mais conspiração contra o Sporting e a sua recuperação.
O baixo sucesso dos jogadores portugueses que emigraram depois dos 24 anos por verbas elevadas pode ser um dos motivos desta desconfiança. Há a consciência, controversa mas real, de que Figo, Rui Costa, Cristiano Ronaldo ou Bernardo Silva não teriam chegado ao topo se não tivessem emigrado tão cedo para ambientes muito mais competitivos e exigentes.
Um investimento de 50 milhões num jogador de 25 anos dificilmente gera retorno financeiro, crescendo a tendência para deixar terminar os contratos e sair a custo “zero”, como aconteceu este ano com os ex-portistas Herrera e Brahimi. Bruno Fernandes vai necessitar de repetir a época passada para voltar a valer metade da cláusula de rescisão, o que não deixa de constituir um teste aliciante para ele e para o clube, dando tempo ao superagente para montar uma operação que resgate honra e prestígio de todos os envolvidos.

Caro Thierry Correia,

Foi com muita curiosidade que observei a tua estreia na equipa principal do Sporting, no lugar de defesa lateral direito, por causa dos impedimentos dos três craques que o clube adquiriu para  a posição nos últimos dois anos por valores cada vez maiores: dos dois milhões de Ristovski para os 4,5 de Bruno Gaspar e para os 8 de Rosier, em três verões consecutivos.

Ao todo, portanto, serão cerca de 15 milhões de euros atirados ao vento numa lógica antagónica à matriz formadora do Sporting. Ontem, quando subiste ao relvado do estádio Algarve, levavas a bandeira de Alcochete, como um último moicano a fazer acreditar na sobrevivência da “espécie”, por contraponto ao adversário, todo orgulhoso dos seus Rubens & Florentinos.

O Nuno Tavares, teu amigo do Benfica e das selecções, também estreou na mesma noite e ficou com a coroa da moeda que tem sempre esta face obscura do lado de baixo. Ele ganhou estrondosamente e festejou muito, tu perdeste copiosamente e choraste até meteres dó. É a vida, meu caro Thierry, e a aventura só agora está a começar.

O Nuno Tavares, que é canhoto e muita gente achava que estava metido numa alhada para fazer o lugar de um jogador de referência como o André Almeida, teve de se preparar para a missão ao longo de semanas e passar por testes exigentes, em conjunto com a equipa.

Tu sofreste uma lesão e tiveste menos tempo de treino, mas, além disso, foste incluído numa equipa, numa formação defensiva em estreia absoluta e num sistema que não foi devidamente ensaiado nem submetido a testes de resistência.

O que o Nuno Tavares teve a mais tu tiveste a menos. E isso fez toda a diferença, uma enorme diferença.

Mas, desde os adeptos aos comentadores profissionais e às redes sociais, o carinho que despertaste no final da partida acabou por retirar-te do rol dos culpados da hecatombe de Loulé. Tiveste responsabilidades em vários golos, na cobertura, na perda de bola, no deficiente posicionamento, repartindo culpas colectivas, mas foste ilibado pela indulgência que devemos aos mais novos e iniciantes. Sabemos, pelo que já fizeste, que vais continuar a crescer e a fortalecer e, quase de certeza, converteres os tais 15 milhões de “reforços” em perda total.

Mas, atenção, os sportinguistas, por causa dos longos anos sem títulos, tendem a não ver a realidade com clareza. Antes daqueles três mosqueteiros, tinha passado um quarto, o italiano Piccini, por quem não davam um chavo mas acabou por render lucro à saída, chegar à selecção italiana e deixar uma boa memória. É assim o Sporting, emotivo, dramático, irracional.

Gostam de ti e desculpam-te os erros, até ao dia em que a frustração dos campeonatos perdidos os leve a transferir-te também para o grande quarto escuro dos filhos que não singraram. A incapacidade de analisar as deficiências próprias e o vício de culpar terceiros são dois dos motivos recorrentes para o insucesso do teu clube. 

Sei que não te iludes e que estás consciente dos erros cometidos neste jogo. Dizem os chineses que, escapando ao perigo de morte, acordamos mais fortes. Por isso, jovem Thierry, seca as lágrimas e segue o teu destino.

03 Ago, 2019

O dérbi fofinho

O amor está no ar. A paz reina. O futebol está com os anjos.

Este é o ambiente na véspera da 41.ª edição da Supertaça Cândido de Oliveira que vai opor, apenas pela quarta vez na história, os dois clubes mais importantes de Lisboa, servindo de lançamento do novo canal oficial da Federação, instrumento assumido de venda do futebol a audiências puras e frescas. Pela positiva e sem polémicas, com a benção do presidente Marcelo. 

Se, em campo, tudo corresse como o emocionante e inesquecível frente a frente dos dois treinadores do Benfica e do Sporting, estaríamos perante o derbi mais fofinho da história e, inevitavelmente, acabaríamos embaraçados pela traição ao espírito do jogo e à história deste confronto. Felizmente, no relvado do Estádio Algarve, não será assim, haverá artistas e não figurantes.

A predisposição dos jornalistas em geral para terem acesso directo aos intervenientes dos jogos, antes, durante e no final, sempre foi uma prioridade que as instituições futebolísticas, com a Federação à cabeça, combateram ferozmente, com o pretexto de que faria mal aos jogadores e treinadores e, por consequência, ao jogo e aos respectivos objectivos. Até microfones voaram para o fundo do lago, em nome dos superiores interesses dos heróis da Nação! 

Agora, os donos da bola defendem que o “produto” será mais lucrativo mediante uma exposição controlada, sem polémicas, sem excessiva paixão, mantendo a reserva dos protagonistas a quem paga os direitos exclusivos e, portanto, como antes, a deixar aberta a válvula de escape dos meios independentes. Eles sabem que o espírito do futebol fofinho só dura até ao apito inicial do árbitro, mas está lançada a ideia de um futuro espectáculo bacteriologicamente puro.

Nos clubes, há muito tempo se restringe o acesso aos protagonistas aos meios internos, incluindo as televisões próprias, tornando a comunicação para o exterior mera propaganda, sem mediação independente e apenas mitigada em conferências de imprensa justificadas pelo tempo de exposição dos painéis dos patrocinadores, cenários e “product placement”, com toda uma lógica de marketing e promoção que está nos antípodas do jornalismo.

Há um português a dominar o Mercado do futebol europeu de quem pouco ou nada se fala, apesar dos extraordinários negócios que tem realizado. Trabalha em França desde 2013 e, apesar de aparentemente ninguém dar nada por ele, em termos mediáticos, nestes seis anos gerou mais-valias na ordem dos 500 milhões de euros 

O Lille acaba de vender Nicolás Pépé ao Arsenal por 80 milhões, Rafael Leão ao Milan por 30, Thiago Mendes e Ikoné ao Lyon por 31 e El Ghazi aos Aston Villa por 9 milhões. As mais-valias são de 98 milhões, em cima de um dos melhores anos desportivos de sempre, com o 2.º lugar na Liga e apuramento directo para a Champions League. Há um ano, o mesmo clube francês tinha investido 9 milhões de euros em aquisições, mas facturou 70 milhões em vendas. Performance nada má para um clube que estava sob vigilância do fair-play financeiro. 

O responsável por este fenómeno é o português Luís Campos, ex-treinador de pouco sucesso e com a nódoa de ter dirigido no mesmo ano duas equipas que desceram de divisão. Hoje, um jornal espanhol chamou-lhe “Monchi de França”, comparando-o ao admirável director desportivo do Sevilha. Em Portugal, tem passado à margem das notícias e, que eu tenha visto, nem nos cada vez mais e maiores espaços ligados ao “Mercado” as suas proezas têm merecido destaque.

Com muita discrição, quase desconhecido, Luís Campos executa em Lille o que já tinha feito no Mónaco, onde gerou mais-valias superiores a 300 milhões de euros, com jogadores como Bernardo Silva, Fabinho, Martial, Lemar ou Mendy. 

Em seis anos, entre Monaco e Lille, as compras e vendas de Luís Campos conduziram a lucros de aproximadamente 500 milhões de euros. Outros fizeram mais dinheiro graças à formação, mas o Lille, tal como o Monaco, tornou-se num caso de estudo com a sua política de prospecção: compras baratas e vendas chorudas. Hoje mesmo, Luis Campos estava em Istanbul para comprar o médio Yusuf Yazici, do Trabzonspor.