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J Q M

Fui jornalista, estive em todo o tipo de competições desportivas ao longo de mais de 30 anos e realizei o sonho de participar nos Jogos Olímpicos. Agora, continuo a observar o Desporto e conto histórias.

J Q M

Fui jornalista, estive em todo o tipo de competições desportivas ao longo de mais de 30 anos e realizei o sonho de participar nos Jogos Olímpicos. Agora, continuo a observar o Desporto e conto histórias.

05 Set, 2018

Benfica condenado

Benfica culpado? Benfica inocente? Parece que a resposta depende da cor clubística de quem julga, porque os indícios de prova são substanciais relativamente à prática criminosa dos funcionários judiciais envolvidos, mas pouco ou nada evidentes quanto aos benefícios desportivos extraídos pelo clube.

Pelo que se conhece do processo e-toupeira, o Benfica é culpado de práticas ilícitas de um seu funcionário em área não desportiva, pela violação do segredo de Justiça, mas inocente da acusação de corrupção desportiva, que me parece mirabolante.

Depois de dois anos de resistência a acusações constantes e múltiplas, o Benfica está finalmente no cadafalso, sujeito a uma necessária reformulação de práticas jurídicas e a um processo de recrutamento humano muito mais rigoroso, mas está também perante uma condenação pública, decorrente da péssima estratégia de comunicação adoptada desde que começaram os ataques aos seus processos e actividades.

Os danos infligidos à imagem e à credibilidade do clube e da sua marca são gravíssimos e podem tornar-se irreversíveis se os patrocinadores deixarem de ser solidários - sendo este o primeiro julgamento a que vai sujeitar-se.

Em relação à culpa provável, a responsabilidade de Paulo Gonçalves revela um funcionário com práticas inadmissíveis e oriundas da “velha escola” de um dirigismo desportivo que se julgava extinto. O Benfica devia tê-lo afastado há muito tempo e, por maioria de razão, quando foi detido e constituído arguido, não obstante as medidas de coação terem acabado por ser estranhamente suaves, ao não o inibir de continuar a trabalhar e, mesmo, contactar a SAD. Paulo Gonçalves é acusado de 79 crimes, sendo o pivô de toda a matéria ilícita do processo, pelas interacções contínuas com os funcionários judiciais acusados.

Sobre a culpa real, a da SAD do Benfica, os indícios são pouco consistentes e não chegaram, por exemplo, para citar Luis Filipe Vieira ou algum dos seus colegas da Administração. A SAD será culpada de ter oferecido camisolas, cachecóis, bilhetes, parques de estacionamento e tratamento VIP em meia dúzia de jogos no estádio da Luz, não sendo, aparentemente, acusada de ter recebido qualquer contrapartida desportiva concreta, apesar de um dos funcionários judiciais ser também observador de arbitragem.

O presidente da SAD e do clube deve retirar as consequências inerentes à sua responsabilidade, ao confirmar-se que autorizou explicitamente os actos ilícitos do assessor jurídico, não se percebendo, contudo, por que razão Luís Filipe Vieira não foi também acusado individualmente pelo MP.

Os órgãos disciplinares da Federação Portuguesa de Futebol devem, de acordo com os regulamentos e os prazos legais, encetar um processo sumário às eventuais más práticas desportivas decorrentes desta situação. É absolutamente necessário à paz desportiva, julgar, condenando ou ilibando, o Benfica neste caso.

O adiamento de medidas internas resolutas por parte do Benfica pode ter consequências ainda mais desastrosas, se prosseguir a sua estratégia de empurrar o caso com a barriga sem contar que o Ministério Público foi muito mais célere e objectivo do que habitualmente.

O primeiro sinal de desconforto e da grandeza efectiva deste processo vai ser dado em breve pelos patrocinadores internacionais do Benfica, conhecendo-se a lógica de rescisão de apoios que tem sido adoptado contra agentes desportivos com práticas censuráveis ou com implicações sociais negativas. Se este caso tornar o Benfica num parceiro indesejável, os sponsors internacionais não deixarão de o mostrar rapidamente e com estrondo.

Os sportinguistas estão chocados com a dispensa de mais três pérolas de Alcochete em contraciclo com a afirmação nacional e internacional dos prodígios do Seixal. Para lá do desaproveitamento desportivo, ainda se somam cada vez mais milhões de euros ao negócio de formação e venda dos jovens do Benfica, em contraste com o reduzido interesse dos mercados mais abonados pelos formandos do Sporting.

No jogo cerrado entre os grandes rivais da formação, o Seixal está a ganhar de goleada a Alcochete, invertendo em poucos anos uma diferença que era diametralmente oposta. Todavia, ainda se nota uma atitude de negação e outra de desconfiança em relação a estes indícios de mudança.

Num lado, acredita-se que Francisco Geraldes, João Palhinha, Matheus Pereira e mais dois ou três deviam fazer parte do plantel que quer discutir o título. A crença absoluta dos adeptos nos valores de Alcochete contrasta com a falta de convicção manifestada por treinadores consecutivos, que sempre preferiram soluções compradas aos mercados externos.

No outro, quase não se acredita que Ruben Dias ou Gedson Fernandes, e previsivelmente João Felix, peguem de estaca e cheguem à selecção principal com poucos meses, ou apenas semanas, de experiência na equipa principal. 

Há aqui algo que não faz sentido. A diferença de qualidade de trabalho entre Alcochete e Seixal não pode ou não devia ser tão acentuada.

Bernardo Silva, João Cancelo, Renato Sanches, Nelson Semedo, Gonçalo Guedes, sairam prematuramente do Benfica para os principais clubes europeus em operações eventualmente inflacionadas pela mediação de Jorge Mendes, mas quase todos conseguiram confirmar e trepar nas listas dos mais procurados, proporcionando ainda mais valias ao Benfica pelas réplicas contratuais que conseguem realizar.

Ora, com as excepções de Bruma, que saiu em litígio, e de Dier, que foi dado ao Tottenham, os jovens leões da mesma geração não estão a competir neste campeonato, só conseguem lugares por empréstimo em clubes europeus de terceiro plano, pelo que tem de ser uma prioridade dos futuros dirigentes do Sporting perceber como se caiu tanto em tão pouco tempo.

Muito mais do que supor que se pode ser campeão com Geraldes ou Matheus, há que fazer contas ao dinheiro que se perde na passagem da formação para o profissionalismo, de que a extinção da equipa B leonina foi um erro crasso.

O Alex Telles não foi para o Real Madrid, o Marcelo não foi para a Juventus, o Alex Sandro não foi para o Paris SG. Acabou o mercado de jogadores e, com ele, o desfile de falsas notícias que ajuda a preencher horas de televisão e páginas de jornal, das quais aquela triangulação de defesas esquerdos brasileiros ganhou a palma da originalidade.

Por acção da nova indústria dos agentes licenciados, o mercado alcandorou-se a grande acontecimento destes meses de transição entre cada época. Nada é mais interessante que a projecção de uma nova equipa, a avaliação dos jogadores, o dispêndio de verbas absurdas.

O FC Porto foi o campeão do mercado pelas vendas de Dalot e Ricardo, que renderam mais do que suficiente para a compra de vários jogadores acima dos seis milhões de euros, com lastro para alguns disparates como Janko e Paulinho. Tudo indica que Militão seja um reforço de enorme gabarito.

O Benfica teve equilíbrio e sentido clínico nas aquisições, depois de mais uma facturação altamente lucrativa com jogadores de segundo (ou terceiro) plano, como João Carvalho, André Horta, Pelé ou Cristante.

O Sporting fez o que pôde, com um orçamento composto com as vendas de Wiliam e Piccini, mas sofreu de forma confrangedora perante as reticências que jogadores e agentes colocaram à situação transitória e à instabilidade e insegurança provocadas pelas claques legais. Mesmo assim, a contratação de Gudelj e a recuperação de Bas Dost e Bruno Fernandes, bem como o regresso de Nani, mantiveram a equipa num nível competitivo.

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